Tu percorres a lentidão espessa das palavras
e do mundo. Conheces o segundo lado
do tempo. A tua concentração é vegetal.
Simplicidade do ser. Glória incandescente.
Iniciadora sem hierarquias, desces por uma espiral
até ao tacto absoluto do corpo.
Pedra ou perspectiva entre morte e abismo.
Recortas as minúcias como um amante sem luvas
e entre dentes e espadas cantas a cor da pedra.
Ou é o olho da terra que tu lambes ou o sangue que gira.
Não, a tua sombra não é dura como um bloco
ou como uma cadeira tremendo: a sua massa grande
é poderosa, mas eu vejo-a como uma tela húmida
e percorro os seus fios verdes, os seus peixes luminosos.
Entre a espuma e a lama, na densidade azul
queimas a tua boca num diamante incandescente
e aproximas o rosto da noite cega e redonda
até que no teu peito as estrelas transpareçam.
António
1988
4 comentários:
Os grandes olhos do António, parados, a trespassarem-nos... e nós sem fuga possível...
Gostei MUITO dos oito últimos versos!
Um abraço, Inês!
Obrigada, Victor.
Esta é uma jóia do meu arquivo, com mais de 20 anos.
I.
Ora até que enfim, Inês!
Gostei! Sabe ao «velho António»!
(gripei outra vez!)
Beijos
Desde que li o primeiro poema de António Ramos Rosa fiquei maravilhado com os escritos desse poeta lusitano. E tão maravilhado que me atrevi a escrever um poema ao grande bardo lusitano:
DESLUMBREI-ME COM AS PALAVRAS
Para o poeta português Antonio Ramos Rosa
Deslumbrei-me com as palavras que
Dançavam num poema de expressão serena.
No âmago dos sentidos eram mãos macias
Que acariciavam minha fronte absorta.
Me fiz silêncio e ouvi o tropel cadenciado
Das rimas num ritmo das bailarinas encantadas.
Um sonho se manifestou reluzente
No cadente movimento das sílabas
A modelar as formas da escrita lusitana
E me vi poeta deslizando em suaves nuvens
De versos luminosos em estático êxtase.
Sou um ser que se eleva, se irradia
Quando repousa seu pensar nos sopros
Esculpidos na brancura de uma página
A espargir centelhas de sabedoria.
Assim adormeço nessa fruição deveras,
Navegando por mares de espumas de versos
E depois ancoro meu barco num berço de quimeras!
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