domingo, 24 de maio de 2009

conversa inacabada

Biografia de LNJ.JPG
samartaime, «Biografia de LNJ»,
óleo s/tela, (92X73cm).1989, Lisboa. (Col.Pes.)
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Nota: Esta "conversa inacabada" é uma evocação pictórica e poética, neste Maio, mês de nascimento da grande poeta Luiza Neto Jorge,já desaparecida, da autoria de Manuela Imar (pseudónimo de Manuela Nascimento Agostinho), a samartaime/pilantra dos blogues, que foi sua grande amiga desde a adolescência.
Fanei esta excelente evocação,
do seu "Abracadabra".Espero que me perdoe.

I. L.
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porque certamente morreremos
e seremos como águas derramadas na terra
que não se encontram mais» Êxodo]

I

Ninguém duas vezes passa o rio
porque os rios se afastam para morrer
ou, correndo nós,
vivemos, disséssemos,
com os rios morrendo.

E com o nível posto
na baixa altura da nascente
incorressem os vivos e
corressem os mares que não
se juntam mais, na mesma igualdade
longínqua.


I I

Dentro de dias morre
mais alguém
para o hermético triunfo
das paisagens.


Então os sitios vão
subindo
povoam-se entreolham-se
desencantam-se.


A órbita apodrece
descrê-se o sol.

Luiza Neto Jorge (*)

Barbara - «Marienbad»


«Ninguém duas vezes passa o rio» (*)

Os dias que me igualam
ao correr do rio sob a ponte
na noite azul da Prússia de Mussorgsky
invadem o memorial das margens
como laranjas incandescentes na garganta
e um silêncio de olho de búfalo
trespassando no capim.

Na veia gasta da memória
uma sombra de mim navega
as sete partidas da melancolia
entre desejos esboroados
pétalas espavoridas
e o cântico sumptuoso dos
gestos inerentes.

samartaime



«Dentro de dias morre» (*)

Os barcos escondem-se para morrer
sob a areia mais rente ao dia
num desenho angustiado de conchas
sinais esquálidos do pálido marfim
da lassidão lavrada pelo tempo
no passajar do sol.
Pequenas águas espelham brilhos
abrigam pratas contam ventos
enredam-se algas, singram búzios
debicam garças e flamingos,
partem insaciáveis gaivotas.

E um cavalo-marinho desliza
os seus olhos tristes.

samartaime



A força da gravidade(*)

A tua gravidade:
o justo peso de que dispões
para rir.

Luiza Neto Jorge (*)


A gravidade do poema

O poema são palavras
que nascem ordenadas
atam
retalham
revolvem
gastam.
Cumprido o ciclo
acabou-se a poesia.

samartaime


(*)Luiza Neto Jorge, [Lisboa, 10 MAI 1939 - 23 FEV 1989, Lisboa], «Ninguém duas vezes passa o rio» e «A força da gravidade» in O Seu A Seu Tempo». (Paris,1964-1965); Ed.Ulisseia, Lisboa, 1966.


Rodrigo Leão - Luiza Neto Jorge : «Magnólia»

sexta-feira, 22 de maio de 2009

BASTONÁRIOS

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Simpatizando-se ou não com o estilo "Marinho Pinto", nunca em tão poucos minutos se disse tanta verdade nua e crua, à "bastonária-tvi", Moura Guedes, da "Ordem- ódio-a-Sócrates". A sua deontologia profissional e actividade "noticiosa", muito que mereciam essa radiografia pública. Independentemente das consequências, o ar, por minutos ficou menos insalubre.

http//www. youtube.com
manuela moura guedes vs marinho pinto

domingo, 17 de maio de 2009

"CA(R)AS"/ CAMAS ?

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Hoje, tive de ir a um desses sítios onde se oferece para leitura, aos clientes, a chamada imprensa cor-de-rosa.
Passaram-me para as mãos uma tal coisa chamada "Caras", edição recente, que exibia na capa a foto de um jogador de futebol conhecido, com a nubente ao lado, uma modelo tuga, em vestido branco e adiantado estado de gravidez, de segundo noticiavam, um segundo filho do casal.
Para do evidente mau-gosto pseudo-libertário, da capa, entreabri a colorida publicação. Noventa por cento dos títulos e notícias ilustradas, versavam: "novos e novas namoradas, rumores de divórcios, casamentos, separações". Umas "CA(R)AS que deviam trocar o "R" pelo "M".

Voltando à gravidez alva da nubente, lembrei-me de um êxito musical da Brodway, da Barbara Streitsand, emtrando em cena vestida de noiva, com um grande barrigão e cantando:
"Sou o mais vivo retrato da sua louca paixão", a que se seguiam estrepitosas gargalhadas da assistência.

Por que será que, grande parte das vezes, a liberdade e o dinheiro servem para estas merdas?

sábado, 9 de maio de 2009

Roland Barthes - (12 Nov. 1915 / 25 Mar. 1980)

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(...)

"Imagino pois uma espécie de utopia, em que os textos escritos com gozo poderiam circular fora de qualquer instância mercantil, e em que, por conseguinte, não teriam aquilo a que se chama - com uma palavra assaz atroz - uma grande difusão. vinte anos, a filosofia era ainda muito hegeliana e jogava muito com a ideia de totalização. Hoje, a própria filosofia se pluralizou e portanto podem imaginar-se utopias de tipo mais grupuscular. Mais falansteriano..

Esses textos circulariam então em pequenos grupos, entre amizades e por conseguinte seria verdadeiramente a circulaação do desejo de escrever e do gozo de ler, que formaria bola de neve, e se encadearia fora de qualquer instância (...)

ESCREVER...PARA QUÊ, PARA QUEM?, Edições 70, Lisboa s/d
1.ª ed. francesa, Grenoble, 1974
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Nota: Descobri Barthes no fim dos anos 70. "Mitologias", "O Grau Zero da Escrita", o inesquecível "O Prazer do Texto", que li e reli e conservo, como os restantes, cheio de sublinhados, "Sade, Fourier, Loyola", "A Câmara Clara", etc, etc.

A sua morte, de acidente de viação e o preconceito das novas gerações e programas pedagógicos contra a cultura francófona, lançaram -no, aparentemente, no esquecimento.
No entanto, este pequeno excerto, quase
profetiza a blogosfera.

sexta-feira, 1 de maio de 2009


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Maio, maduro maio quem te pintou?
Quem te quebrou o encanto, nunca te amou.
(...)

Zeca Afonso