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A renda de bilros é uma indústria da beira-mar, destas
mulheres loiras, de olhos azuis e rosto comprido – as da Foz,
as de Leça e as de Vila do Conde – que passavam a vida à
espera dos homens, enquanto as mãos ágeis iam tecendo
ternura e espuma do mar. (…)
Raul Brandão – Os Pescadores
As raparigas da Foz há muito deixaram
de enlaçar os bilros sobre as almofadas.
Já não imitam nos meandros da renda o desenho
das ondas. Nem esperam, rodeadas de filhos pequenos
o regresso do seu modesto ulisses. Hoje
trabalham na pizzaria ou servem pregos e finos
na esplanada. Com um pouco de sorte fazem
um Curso de Gestão ou de outras ciências
ocultas para gáudio da família que as vai
ver desfilar no Cortejo da Queima e noutras
praxes saloias que a turba não dispensa.
Também há as outras, que ao certo não
sei o que fazem, mas que ainda debutam
aos dezoito anos ao som de O Danúbio Azul,
com reportagem na imprensa rosa.
Mas o certo é que o mar da Foz não desbotou
jamais a sua cor atlântica, nem desistiu,
desde há milénios de receber o Douro,
embora os caranguejos, as lapas
e os beijinhos nos tenham abandonado
como as histórias de antigos piratas e Robinsons
deixaram os nossos sonhos.
O mar da Foz envplve na salina rebentação
aquele poderoso rio, que apesar de retido
em comportas de barragem, incorpora
desde a nascente o corpo feminino
das ribeiras que para ele correm ainda
como rendilheiras, no regresso dos barcos.
I. L.
(Junho 2009)
Nota: este poema é dedicado a um ilustre fózeiro, Miguel Veiga, tendo sido destinado a uma prenda/surpresa da iniciativa editorial de José da Cruz Santos, da Editora Modo de Ler.
quinta-feira, 23 de julho de 2009
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5 comentários:
Caríssimos: adianto que o meu novo livro está a venda nos seguintes locais:
Livraria Trama , Lisboa
Livraria Poesia Incompleta , Lisboa
Livraria Pó dos Livros , Lisboa
Livraria Letra Livre , Lisboa
...em breve espero tê-lo em Évora, Porto e Faro.
O lançamento será algures em Setembro, algures em Lisboa. Não foi agora devido às providências cautelares interpostas pelos dois maiores partidos com assento parlamentar, a santa inquisição, várias obediências maçónicas e um talhante de Paderne.
Para saberem mais, é apenas visitarem
http://pdaherois.blogspot.com
Gostei, amiga. Adoro Raul Brandão e o Veiga é um "Fózeiro" cheio de "panache". Pena ser daquele partido...embora não pareça, porque ele nitidamente não se interessa pelos poleiros.
Mas, o seu poema é um mimo de ironias nostálgicas.
Bjos
B.
Que saudades de Raul Brandão!
De todo ele.
Dos Pescadores, particularmente.
De si, deixei-a há bocadinho, ainda não tenho saudades, mas gostei muito do poema.
Gostei que tivesse dedicado o poema ao "fózeiro" Miguel Veiga, que é do PPD fundacional (de Sá Carneiro, de Emidio Guerreiro, do pessoano José Augusto Seabra e etc.).
Já não gostei que chamasse "saloia" a umas meninas que...
Eu moro na região saloia, que tem uma cultura (hoje evanescida), mas ainda tem marcas no fazer, no estar e no ser.
É região arabizada onde se encontram étimos interessantes: charrua, enchara, enxada, enxó, entre outros.
Todos derivam de "çahroi", o que labuta a terra e deu, segundo os linguistas...saloio.
Abraço,
J.A.
Obrigada, amigos. Certeiras palaveas, Belmira.
JA, aqui "saloio" é na acepção de "parolo", "pacóvio".
Nós aqui no Nortugal , particularmente os "tripeiros" somos todos "parolos", ao que consta entre os "sulistas, elitistas" :)))). Não temos "região saloia".
Creio ter assinalado que escrevi este texto a pedido do Cruz Santos, um editor amigo, a quem não sei dizer "não". É óbvio que a figura do MV, que conheço pessoalmente, me é simpática.
Beijos a todos.
I.
Então, bom-dia
(se é que uma sulista convicta pode desejar um dia bom a uma tripeira!)
Tenho andado calada por nada de novo se me vislumbrar e por ter a cabeça mais em Lisboa que aqui. É o costume mesmo. Zarpo sexta, preferia quinta. Pelo menos a «viagem» distraia-me.
Bjs,M
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