segunda-feira, 5 de março de 2012
A Criança Que Ri
CXXXII
O suspiro é uma palavra que me é próxima. Existirão, certamente, palavras um tanto ou quanto mais confusas, tais como alívio ou consolo. Eu sou um vivente disléxico. Quero dizer uma palavra e sai-me outra.
Morro sem soltar um único suspiro.
Construo o muro. Sobreponho argamassa sobre argamassa e não chego à flor.
Os comprimidos são tão ruidosos como a porta a que bato. Vinda do negrume vem a injecção. Enterrada no rabo amolecido.
Lembro-me de uma palavra e quero dizê-la. Quero dizer a palavra. Procuro de memória a palavra que não chego a dizer. Não basta saber dizer uma palavra para a dizer.
Eu altero a palavra para a dizer. Altero a palavra e isso basta.
Carlos Torres Figueiredo, Modo de Ler,Porto, 2012, p.p. 140.
Foi atribuído a este livro o Prémio de Poesia Eugénio de Andrade 2011 conforme vem assinalado na capa.
"Nasceu a 5 de Março de 1968, em Lisboa. Curta biografia. Tudo o mais são pormenores que poderiam ter sido de outro modo. Assim fossem".
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